Quando iniciamos os trabalhos do “Programa de Valorização da Cachaça” idealizado pelo Instituto de Desenvolvimento Industrial de Minas Gerais – INDI, no início da década de 1980, havia no estado 1500 fábricas de aguardente. Destas, aproximadamente 15 eram de tecnologia industrial e as demais de fabricação artesanal, dentro de um processo natural de fermentação e destilação em alambiques de cobre.
Vários problemas foram identificados, merecendo destaque o baixo nível tecnológico das fábricas artesanais e a falta de uma estrutura comercial.
A cachaça produzida, principalmente em pequenos alambiques, em termos econômicos, não apresentava condições de competitividade com as aguardentes industrializadas. O rendimento agrícola, em média de 60 t de cana por hectare era 33% menor do que o obtido nas destilarias de grande porte. O rendimento do processo artesanal variava de 60 a 80 litros de aguardente a 50% de teor alcoólico por tonelada de cana, enquanto na industrial se alcançava 150 litros por tonelada de cana a 42% de teor alcoólico.
As destilarias de aguardente industrial em Minas Gerais tinham uma produção diária que variava de 5000 a 80000 litros, com uma média de produção diária estimada de 10000 litros.
As fábricas artesanais, que englobavam 99% do universo das indústrias existentes, eram de pequenos alambiques com produção diária média de 150 litros.
Tudo foi desenvolvido priorizando a qualidade da Cachaça. Dominando, naquela conjuntura, a tecnologia da produção da cachaça de alambique, tínhamos consciência que estávamos trabalhando para a obtenção de uma cachaça diferenciada, um novo produto, que não se igualava à aguardente industrial.
Sem estrutura de comercialização, as vendas eram locais. Poucos produtores tinham seu produto engarrafado diretamente. Quase a totalidade da produção era vendida para engarrafadores regionais.
Havia uma realidade que dificilmente seria vencida: “A preferência da grande maioria dos consumidores se baseava no preço da cachaça, não importando com a qualidade”.
Entretanto, foi identificado, que havia um nicho de mercado para a cachaça de alambique, onde o consumidor, mesmo pagando um preço superior, preferia buscar a cachaça artesanal diretamente da fonte produtora.
Com a inovação tecnológica implantada a partir de 1983, envolvendo trabalhos técnicos que demonstravam a elevada rentabilidade da cachaça de alambique, em seu processo natural de fabricação, um número significativo de empreendedores interessou em investir no setor.
De 1983 a 1997, já tínhamos assistido cerca de 200 empresários, efetivando a implantação de aproximadamente 100 alambiques, dentro de uma nova concepção tecnológica.
No início do ano de 1988 criamos a Associação Mineira dos Produtores de Aguardente de Qualidade – AMPAQ, que possibilitou um avanço na dinâmica dos trabalhos.
Destacaria como principais iniciativas os “Cursos de Produção de Cachaça de Qualidade” realizados periodicamente, a partir de 1995, com grande número de alunos empreendedores e o “Programa de Garantia de Qualidade” criado em 1990.
Instituímos o “Selo de Garantia de Qualidade” que certificava a qualidade das cachaças analisadas em suas condições fisicoquímicas e sensoriais. Essa ação permitia com maior facilidade, a introdução de novas marcas no mercado.
Do final da década de 1980 ao final da década de 1990, foi realizado um intenso trabalho de marketing, com destaque para o “Festival da Cachaça de Sabará, onde as cachaças eram expostas e degustadas com grande sucesso. Por votação dos consumidores, a cada ano do festival, era eleita a melhor cachaça.
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A AMPAQ, junto com o apoio de vários órgãos governamentais, com destaques para a Secretaria de Estado da Agricultura Pecuária e Abastecimento – SEAPA, o Centro Tecnológico de Minas Gerais – CETEC e o Instituto de Desenvolvimento Industrial de Minas Gerais – INDI, Federação da Agricultura do Estado de Minas Gerais – FAEMG e o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – SEBRAE compartilharam de ações substanciais para o desenvolvimento do setor da cachaça de Alambique.
Eventos importantes foram realizados, com destaque para os “Encontros Mineiros de Produtores de Cachaça de Alambique” e “Encontros Técnicos do PROCACHAÇA”. Também, organizadas pela AMPAQ, realizamos visitas técnicas à produção de conhaque na França e de uísque na Escócia.
A mídia espontânea deu um apoio incomensurável aos trabalhos realizados, contribuindo diretamente com um marketing substancial.
Artigos nos principais jornais e revistas do Estado e do País reportavam os acontecimentos que ocorriam no setor. Entrevistas nas principais redes de televisão e de rádio colocavam a população ciente do processo de aprimoramento da cachaça artesanal.
Essas atitudes técnicas e de marketing provocaram uma mudança no habito dos consumidores em favor da cachaça de alambique, em tempo recorde a cachaça de alambique caiu no gosto do consumidor mineiro. De uma situação onde em bares, restaurantes, mercados e supermercados só se viam nas gôndolas ou prateleiras as cachaças industriais, em apenas quinze anos, passou a ter a predominância das cachaças artesanais. Outra consequência foi o fechamento no Estado das destilarias de aguardente industrial.
O trabalho de valorização da cachaça de alambique em Minas Gerais é irreversível, hoje tem apoio das instituições de ensino, pesquisa, assistência técnica, creditícias e ampla participação de toda a sociedade mineira.